Revestimento cerâmico da nave e capela-morCapela do Salvador do Mundo
[Castelo de Vide]
Número: CVIDE_SMD_SlvM0101
Designação: Revestimento cerâmico da nave e capela-mor
Tipo de Património: Azulejo
Classificação: Revestimento cerâmico\figurativo
Revestimento cerâmico\figura avulsa
Descrição: Sobre o arco triunfal observa-se um painel de dimensões reduzidas representando Nossa Senhora do Pilar. O arco e as paredes laterais da capela-mor apresentam, inferiormente (nível 1), uma distribuição do revestimento idêntica, marcado pela presença de uma barra com flores; uma faixa de albarradas ou cestos floridos e, a mesma barra no arco e uma outra de enrolamentos de acanto nas paredes. Em todos os cunhais foram aplicadas cantoneiras com flores. O arco é revestido por azulejos de figura avulsa que representam, maioritariamente, flores, embora sejam também visíveis pássaros. A abóbada exibe o mesmo género de revestimento, mas cada pano da abóbada é delimitado por cercadura de enrolamentos de acanto. Para além das flores e das aves, observam-se também barcos e um rosto masculino. Os motivos de flores ocupam quase todo o azulejo, mas em alguns a área branca parece destacar-se, criando zonas de menor densidade de azul. Na parede do lado do Evangelho, o segundo nível, composto por várias figurações, é delimitado por barra de acantos com concha nos cantos. Este revestimento é interrompido, ao centro, por um vão de acesso à sacristia que não deveria aí existir originalmente, ou quando os azulejos foram concebidos, pois em seu redor a barra apresenta uma fiada única de azulejos, pouco ordenados. De cada um dos lados, mas elevando-se sobre o lintel, surge uma fonte barroca. Sobre a porta e entre os remates das fontes, observa-se uma ponte. Mais acima e acompanhando a forma ogival das paredes, representa-se a Fuga para o Egipto.
Na parede oposta registam-se as mesmas trocas de azulejos. Inferiormente, observa-se o Descanso durante a Fuga para o Egipto. Mais acima e, acompanhando o remate ogival da parede, Cristo Salvador do Mundo. O frontal de altar respeita a habitual estrutura de sanefa e sebastos, aqui decorados por enrolamentos de acanto com franjas no primeiro. Nos ângulos foram aplicadas cantoneiras idênticas às restantes. No pano central, de aves e ramagens, figuram vários animais (leões, cão, raposa) e aves por entre ramagens, a central suportando uma cartela figurativa. Esta, de formato elíptico e decorada com folhas, exibe a inscrição AB D.A.C. e a data de 1695, circunscrevendo um episódio que se pensa corresponder ao Nascimento da Virgem. A mesa do altar exibe azulejos de figura avulsa e, de cada um dos lados, um vaso florido ligeiramente diferente dos restantes. A ladear o retábulo-mor observa-se novamente a barra de rodapé, na vertical.
Ficha n.º 532 referente aos edifícios religiosos de Castelo de Vide, integrada no "Repertório Fotográfico e Documental da Cerâmica Arquitectónica Portuguesa", promovido pelo Instituto de Promoción Cerámica (Castellón, Espanha) e realizada por Rosário Salema de Carvalho, com revisão técnica de Isabel Ferreira.
Proposta de leitura do programa iconográfico A análise cuidada deste revestimento evidencia incongruências bem evidentes ao nível da junção de azulejos e das temáticas, bem como o corte e adaptação de diversos elementos. Assim, a leitura do programa iconográfico desta ermida implica considerar uma adaptação dos azulejos após a concepção dos painéis. O desenho das fontes barrocas que ladeiam a entrada para a sacristia foi interrompido de forma a ser encaixado no pequeno espaço que lhe era destinado. Grande parte do tanque, para onde jorram as bicas da fonte do lado esquerdo, desapareceu, e algumas das bicas correm já para as barras de cercadura. O mesmo acontece com a paisagem que a deveria integrar. E embora se tenha conservado o letreiro "fonte de missericordia", um dos anjos que o segura ficou de fora do painel. Do lado oposto, a situação é em tudo semelhante, embora os cortes não sejam tão evidentes. No registo imediatamente superior grande parte dos azulejos foram trocados na montagem. A ponte não se enquadra, de forma nenhuma, com a Fuga para o Egipto, ainda que o ladrilhador se tenha esforçado por disfarçar um sem número de imprecisões com ramagens ou nuvens. Do lado oposto - Repouso durante a Fuga para o Egipto - encontram-se parte dos azulejos que deveriam pertencer à Fuga e que são bem visíveis na gravura de Pietro del Po que serviu de base à composição (CARVALHO - "O programa artístico […]", p. 158, reconstituição).
De acordo com os estudos já efectuados, a deficiente colocação dos azulejos deve-se a um levantamento problemático da zona a revestir e o consequente envio de dimensões erradas ao pintor, que não teriam considerado a existência da porta da sacristia. Ou, em alternativa, a necessidade de abrir a porta da sacristia ocorreu logo após a aplicação dos azulejos.
Estes supostos erros de cálculo devem-se, muito possivelmente, à integração do retábulo, encomendado em 1692, que necessitava de um acesso à tribuna, problema que se resolveu abrindo as escadas que hoje observamos, e que comunicam com a sacristia. Ou seja, as escadas e a sacristia, que constituem dois volumes diferenciados e assimétricos em relação aos restantes volumes do edifício, devem ter sido erguidos apenas nesta época, e em consequência da necessidade de acesso à tribuna do retábulo.
Por outro lado, o remate dos painéis do Salvador e de Nossa Senhora do Pilar, é idêntico, tal como o número de azulejos que os compõem. Acrescentando a esta coincidência o facto de o painel da Fuga ter sido cortado lateralmente, devido à forma da parede, em ogiva, fica a convicção de que a montagem dos painéis do lado da sacristia deveria seguir o modelo do que lhe fica defronte. Ou seja, rodapé, cena da Fuga para o Egipto, a que sobreporia Nossa Senhora do Pilar, tal como o Salvador se sobrepõe ao Descanso. Assim, os dois patronos da ermida e confraria estariam ao mesmo nível e em lugar de destaque na capela-mor, sendo complementados pelas imagens de ambos contidas no retábulo. A existência de uma porta terá levado a que o painel de Nossa Senhora do Pilar se deslocasse para um outro local da ermida, suficientemente digno, e que houvesse a necessidade de encomendar dois painéis para enquadrar o dito vão. Estes problemas deverão justificar a confusa e atribulada montagem dos painéis, tal como a observamos actualmente. As duas fontes de misericórdia devem ter sido encomendados depois para complementar o revestimento.
O programa iconográfico original ganha assim uma nova luz e um significado preciso. Colocando a par Nossa Senhora do Pilar e o Salvador, "a leitura iconográfica sairia reforçada, uma vez que Maria comunga da dupla natureza de Cristo e a invocação em causa alude simultaneamente à vida terrena de Maria e à sua natureza divina, encerrando em si mesma a totalidade da simbologia cristã - a fé indestrutível é representada pelo pilar, e o Menino que a Virgem segura ao colo é símbolo da salvação da alma à qual, por sua vez, a ermida é dedicada" (CARVALHO - "O programa artístico […]", p. 171).
- 1695-00-00 [Revestimento]
Datado - frontal de altar, parede 3, secção 2
-
Gabriel del Barco - Pintor (Atribuído - [1979] MECO - Azulejos de Gabriel del Barco [...], p. 69-124; [1979] MECO - O pintor de azulejos, p. 63; [1986] MECO - O azulejo em Portugal, p. 216; [1989] MECO - Gabriel del Barco, p. 67; [2003], SERRÃO - O Barroco [...], p. 123)
» 4 - Sociedade, Civilização, Cultura\41 - aspectos materiais da vida diária\41A - alojamento\41A6 - jardim\41A65 - instalação de água no jardim\41A651 - fonte de jardim
[Parede 2, nível 2, secção 1]
Descrição: A do lado esquerdo, com tanque inferior não visível, desenvolve uma secção de peixes de cuja boca jorra água e cujas caudas suportam a bacia superior, gomada, de onde se projectam máscaras que, por sua vez, jorram água também para o tanque inferior. Sobre esta, nova secção com máscaras mais reduzidas, rematada por uma figura masculina sentada apoiada num bastão, sendo visíveis atrás de si vários repuxos. Sobre a fonte, dois anjos esvoaçantes seguram uma cartela onde se lê, em maiúsculas: FONTE DE / MISSERICOR / DIA.
Localização: Parede 2, nível 2, secção 1
» 7 - Bíblia\73 - Novo Testamento\73B - nascimento e juventude de Jesus\73B6 - o massacre dos inocentes e a fuga para o Egipto (Mateus 2:13-23)\73B64 - a fuga para o Egipto e os milagres durante a viagem
[Parede 2, nível 2, secção 3]
Descrição: A composição é dominada pela presença de um comprido burro onde segue, sentada, Nossa Senhora com o Menino ao colo. Num plano ligeiramente recuado, ao lado do burro, São José, a pé e apoiado no seu cajado, ergue uma mão virando-se para olhar para o anjo que sobrevoa a cena, paralelo à Virgem. Os panejamentos esvoaçantes e as asas de grandes dimensões conferem grande imponência a esta figura que aponta, com o indicador da mão esquerda, para a frente, parecendo dirigir-se a São José. Muito embora as cenas descritas sejam coerentes e perceptíveis, a verdade é que boa parte dos azulejos envolventes não têm continuidade e parecem ter sido aplicados sem critério.
Localização: Parede 2, nível 2, secção 3
» 4 - Sociedade, Civilização, Cultura\41 - aspectos materiais da vida diária\41A - alojamento\41A6 - jardim\41A65 - instalação de água no jardim\41A651 - fonte de jardim
[Parede 2, nível 2, secção 3]
Descrição: A fonte colocada à direita da porta é composta por tanque inferior onde se apoiam figuras masculinas sentadas, e encostadas a potes deitados, dos quais jorra água. Coroadas com folhas de louro, seguram uma pá e uma âncora. Ao centro, uma máscara deita água e, sobre esta, uma composição de pedras deixa visível um repuxo. Duas cabeças de animal marítimo projectam água para baixo e, no remate superior, surge novo repuxo. Por cima, outros dois anjos seguram uma cartela com a mesma legenda: FONTE / DE MISE / RICORIDA.
Localização: Parede 2, nível 2, secção 3
» 7 - Bíblia\73 - Novo Testamento\73B - nascimento e juventude de Jesus\73B6 - o massacre dos inocentes e a fuga para o Egipto (Mateus 2:13-23)\73B65 - descanso durante a fuga para o Egipto
[Parede 4, nível 2, secção 1]
Descrição: O Descanso durante a Fuga para o Egipto revela, num cenário natural com uma tamareira do lado direito, Nossa Senhora com o Menino ao colo, sentada, e dois anjos ajoelhados, à sua frente, um deles segurando um cest). À direita, São José observa a cena encostado a uma coluna, cujo capitel se encontra no chão. Acima, três anjos meninos seguram palmas de martírio, numa alusão à futura Paixão de Cristo. Esta representação encontra-se, aliás, repleta de simbolismo, pois a coluna quebrada a que São José se encosta pode aludir ao episódio da queda dos ídolos, e, em última análise, à substituição da velha ordem pela nova ordem representada por Jesus.
Localização: Parede 4, nível 2, secção 1
Material
Matéria transformada\Produto cerâmico\Azulejo [Azulejo]
Técnica
Cerâmica de revestimento\Técnicas de decoração\Faiança\À mão livre [Azulejo]
Cor
Branco [Vidrado]
Azul [Pintura]
Bibliografia - Monografias Bibliografia - Periódicos MECO, José - Azulejos de Gabriel del Barco na regiäo de Lisboa: período inicial, até cerca de 1691. Boletim Cultural da Assembleia Distrital de Lisboa. Lisboa. 85 (3ª série) : Assembleia Distrital de Lisboa. (1979), pp. 69-124.
MECO, José - Os frontais de altar quinhentistas e seiscentista de azulejo. Boletim Cultural da Assembleia Distrital de Lisboa. Lisboa. 92 : Assembleia Distrital de Lisboa. (1990-1998), pp. 11-96.
MECO, José - O pintor de azulejos Gabriel del Barco. História e Sociedade. Lisboa. 6 e 7 (1979/1981), pp. 58-67 e pp. 41-50.
CARVALHO, Rosário Salema de - O programa artístico da ermida do Rei Salvador do Mundo em Castelo de Vide, no contexto da arte barroca. Artis - Revista do Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa. Lisboa. 2 : Faculdade de Letras de Lisboa. (2003), pp. 145-180.
- Francisco Queiroz (2011-08-12, Inventariação in situ)
- Rosário Salema de Carvalho (2012-10-30, Investigação e inserção de dados no âmbito da tese - A pintura do azulejo em Portugal [1675-1725] [...])